quarta-feira, agosto 29, 2012

Não é poesia: RTP, etc.

Sem pretender de modo algum revelar simpatia pelas calinadas da Troika (que nome!) e do atual governo, acho igualmente que me sentiria mal comigo mesmo se não deixasse aqui bem claro que estou farto de os ouvir a todos, da direita à esquerda e da esquerda à direita e que poderia constituir uma atitude de alguma responsabilidade por parte da malta aparentemente importante que vai surgindo nos canais de televisão (que, claro, não sou obrigado a ver, tanto mais que o que não falta é canais no Cabo, livros para ler, coisas para escrever e muito mais) se compreendessem que a paciência não abunda e que, contrariamente ao que dizem do meio das suas bolhas de oxigénio, a maioria das pessoas não está mesmo nada com eles.
Isto vem a propósito, antes de mais mas a propósito de tudo, do presente folhetim da privatização da RTP. Os indivíduos ligados à RTP não concordam? Mas que admiração! Como é que quem lhe vê fugir o tapete debaixo dos pés e correr o risco de passar a ser responsabilizado, a deixar de sugar o erário público para fornecer um serviço no qual, de tanto ser igual ao de qualquer outro canal de sinal aberto, não me recordo de encontrar nada de público? A esquerda não concorda? Que espanto! Pois não é um facto bem documentado que, para a esquerda, tudo o que é público é louvável, pouco importando que se trate ou não de um negro poço sem fundo, e que tudo o que é privado é obra de um qualquer satã de pacotilha e do seu exército de diabretes medievais? A direita está de acordo? Que estupefação! Então não é verdade que tende a pensar o mesmo que a esquerda, só que em sentido oposto, mesmo se é visível que as privatizações nacionais, talvez fruto não só de cumplicidades como também da nossa pequenez, têm, regra geral, levado a nada mais, nada menos do que à constituição de cartéis que prejudicam simultaneamente o Estado que se supõe representar os cidadãos e os próprios cidadãos?
Diferenciem a RTP, ponham-na a viver de si mesma ou com meios muito mais modestos, façam dela um efetivo serviço público e pode ser que eu e (já que está na moda dizer que todos os portugueses pensam como nós e assim se manifestam) os restantes portugueses se preocupem com esse ridículo fait-divers que é a privatização da RTP. Muito bem, talvez a 2 se possa classificar como um serviço público q.b.... Mas quando vejo, como vi, um programa da 2 na RTP Internacional que parecia pura propaganda bolchevique/gonçalvista e que assim passou, não só para Portugal como para todo o mundo lusófono, pago certamente apesar de cheio de incorreções de índole puramente ideológica e que parecia particularmente dedicado ao falecido capitalista Champalimaud enquanto ataque pessoal que pouco interesse público terá, logo mais mentirosa que simplesmente inverdadeira, fico com algumas dúvidas...
E isto, numa outra dimensão, faz-me pensar nos atabalhoados/experimentais concursos de, hiperbolicamente falando, milhões de professores dos quadros em 2012, porque, penso eu, o MEC poderá ter optado por fazer tudo aparentemente em cima do joelho com os olhos efetivamente postos em 2013, e no divertido diálogo que mantive, via email, com um responsável da Fenprof, indignadíssimo (chocadíssimo, como o brilhante líder do PS tornou moda dizer-se, ou inaceitável, idem aspas) pela pergunta que levantei: "Como é que a Fenprof permitiu que se chegasse a isto?". Em outros termos, como é que quando Sócrates estava no poder, com governo maioritário, a Fenprof teve poder e agora, com um outro governo maioritário, a Fenprof (que entretanto passou de "amiga" de todos os professores a auxiliar apenas quem for sindicalizado) parece uma galinha depois de lhe cortarem o pescoço, perdoem-me a expressão? Não estou a ver exatamente a diferença abismal, exceto pelo lado da Fenprof...
Mas pronto, disto da Fenprof ninguém sabe nem quer saber. Fiquemos-nos, então, pelo todo... Passei o mandato de Sócrates, a estranha personagem que conseguiu hipnotizar quase todos os portugueses, quer comprando-os, quer vendendo-lhes as ideias peregrinas de que estava a fazer o que mais ninguém jamais tinha tido coragem de fazer e que se tratava de acabar de uma vez por todas com as "benesses corporativas" de alguns "privilegiados" vindas da "balda do 25 de Abril" (não estou a colocar as palavras na boca do homem, mas ele, que é suficientemente esperto, saberia bem do que falo), a pregar no deserto e a ser olhado desconfiadamente pelo canto dos olhos. Porque é que haveria agora de me preocupar com um Sócrates de segunda casta como o nosso caro Miguel Relvas?
Sabem que mais? Destruam tudo (ou quase tudo) e reconstruam a partir do nada, a ver se ocorre algum milagre de Nossa Senhora de Fátima. Até lá, estou farto de os ouvir. A todos. E mais: Morra o Dantas! Morra pim!

segunda-feira, agosto 27, 2012

Yasmine


Os campos de luz longa do jasmim
Que atapetam as narinas da imaginação
Falam de berberes e peregrinação
Se bem que só imagens cheguem até mim

Dançam pelo ar em penas voltejantes
Que vêm derramar-se na nossa varanda
São nuvens pequenas em céus de lavanda
Naturais e ténues sob os tons escaldantes

Os sons, as cores, toques e perfumes
Misturam-se todos como profecias
Que alguém reescreve ao passar dos dias
E o mundo adormece desde o mar aos cumes

Imagem de: 123people.co.uk

Hammamet


Vejo aqui claramente o Algarve que perdemos
E que eles, quase todos, acreditam ter perdido
Bazares modernizados perto do mar esbatido
E areias que todos sujam na terra dos sarracenos

Não encontrei mesquitas; facto: nem as procurei
Há mais tradição em Córdova, na morena Andaluzia
Que recorda sem querer os tempos da mouraria
Do que onde cada estrangeiro se pode imaginar rei

É a globalidade, o tempo quente do estio
Do all-inclusive comprado como tudo no presente
Num mundo pouco saudável, num mundo pouco doente
Antes de outras latitudes mergulhadas em vazio

Imagem de: hotels-tunisiens.com

Jovens


Recordo dispersamente esses jovens que se criam
Como cascas de cebola difíceis de separar
Do que se afirmavam, pequenos balões no ar
Estúpidos burgueses, nobres de alma, populares que anteviam

Uma vida toda lisa, sempre igual às suas crenças
Como corações-linhas retas em salas de hospitais
Eu achava apenas algo e eles que sabiam mais
Do que jamais poderiam: metamorfoses, doenças

Sei de poucos hoje em dia, tantos deles se ficaram
E isso pouco me importa, a presença é sempre vaga
Como a ideia incerta e lunar que se apaga
Ao mínimo gesto igual dos que se acham como acharam

Imagem de: eoasga.org

Americanos


Os americanos inventam, proíbem, reinventam
Na terra dos bravos e dos livres
Queimam elepês e dançam à volta da fogueira
Como pseudo-índios sem máscaras em direto para o mundo
Porque as máscaras esvoaçantes somos todos e ninguém
Todos nós, todos nós americanos no ground zero...
Pelos cinco continentes, up, up and away
Todos, em hotéis tunisinos cravejados de no smoking
Porque nós, os espanhóis também, vivemos em Hollywood
Algures na Hollywood que já li em letras na colina
Gigantescas, claro, só em letras na colina
Algures, onde os mais frágeis astros definham e se apagam
Longe dos ecrãs e dos comprimidos
Que nos tornam gigantes e anões

Imagem de: americasolidarity.org

quinta-feira, agosto 09, 2012

Toada de agosto



O que faz um homem com vidros na voz
Cigarro na mão, rosto enrugado, olhar tão vazio
Quando se dirige altaneiro a uma popular
Numa rua qualquer com o sol a pairar?
E os migrantes pelas esplanadas
Em tom megafónico falando de nadas
Para que todos saibam que bem que lhes corre?
E as ruas vazias enchem-se de vozes
E agosto arrasta-se, afunda-se e morre…

Imagem de: uni-cc.blogspot.pt (foto de Vítor Cid)
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