sábado, março 29, 2014

Cão amarelo notívago


Passa das duas, junto da estrada, sob o céu nublado
Um cão amarelo ergue-se em vigia no tempo parado
Um abandonado que ladra, por vezes, ao carro passante
E se quiser, sem ordens de alguém, solta-se uivante

À hora tardia, o ser pensante dorme um sono perturbado
De quem segue as regras (dormir inclusive)
Sempre esteirado num leve declive
Que o acorda vago e sobressaltado

Outros fumam, bebem, conversam pela noite calada
Não sonham ainda os seus pesadelos
Que caem como granizo grosso eriçando os pelos
E não sabem também da sentinela serena na estrada

Quão mais luminosa não seria a noite (e os dias singelos)
Se mais povoada fosse de lúcidos cães amarelos!

Imagem de: www.fireflyforest.net

domingo, março 09, 2014

Os sinos da minha aldeia


Os sinos da minha aldeia
Badalam sempre a finados
Se falo na minha aldeia
Não é por querer copiar
Quem melhor soube cantar
À luz crua a mesma ideia –
Estamos apenas cruzados.
À luz crua da igreja
Com os sinos sempre a dobrarem
E os habitués a cantarem
Há a mesquinhez que sobeja
Mundo fora, para quem veja
A ignorância persistente
Quer do ateu, quer do crente.
Vivem na aldeia gigante
Afogados em certezas
Sentam-se em redor das mesas
Senhores de cada instante
Ignorantes da noção
De que um dia partirão.

Imagem de: www.romulogondim.com.br
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