The big brotherchip
É o martelo que nos impede
De esfacelar o olhar do inimigo
A masmorra funda onde a rataria
Anula o tribal que assim se esvazia
De machos guerreiros e abstractos, do perigo,
De fêmeas que aplaudem e vivem da sede
O controlo é urgente e civilizado
Começa em criança e nunca termina
Reza-se no céu, geme-se no inferno
Vive-se com pulseiras de controlo eterno
Que não são limpas sequer pela vermina
Que desprotocoliza o mundo fechado
Tudo é tão perfeito no imaginário
Colocam um chip no nosso automóvel
E um segundo chip no coração
Como no rodopio do escorpião
Mexem-te no cérebro para te ter imóvel
E encerram-te os gritos dentro de um armário Imagem de: www.alteredesthetics.com.
La famiglia
O mundo é uma Sicília estranha
E cada ser um comerciante
Os grupos reúnem-se num restaurante
E brincam nas pias plenas de lasanha
Pode sempre recusar-se uma proposta
Mas os originais são amesquinhados
E acabam pobres, esquecidos, cansados
Almas ausentes da mesa bem posta
Acabam invisíveis, desaproveitados
Sombras de sombras do mundo do Aquém
Onde quer que cheguem não encontram ninguém
Para cada banquete não são convidados
Porque tudo é uma Sicília normal
De livros, revistas e seitas secretas
E não conheço santos nem ascetas
Somente os que servem e os do bacanal Imagem de: http://zhengyong.net (do filme O Padrinho, de Francis Ford Copolla).
Um irretornável retorno
É sempre a mesma coisa!, um velho exclama
Empurrado pela enfermeira num hospital
Diga o que disser é confuso, está mal
Cheira subjectivamente a morte e a cama
Outrora respeitável, balbucia agora
Sentenças que ninguém entende
Ele é como o tempo que se estende
Somente enquanto alguém nele se demora
E em simultâneo há crianças a nascer
Neste hospital onde a minha mãe me amou
E o meu pai e a minha avó. Tudo mudou
E os espaços só significam o que se quiser Imagem de: http://info.jpost.com.
O etéreo retorno 2
O tempo combina, solitário
Em pálpebras cerradas movimentos
Que cruzam realidades, pensamentos
Como peixes estonteados num aquário
Segue ao meu lado a minha mãe saudosa
Aconselhando calma e condução
Ao deslizar do volante em minha mão
Rolando numa estrada pedregosa
Ignoro onde estejamos, eu e ela
Na extrema confiança que me atinge
O pensamento cria, o pensamento finge
E eu olho o rio ao lado pela janela
Inverto então a marcha, temerário
Sentindo a curva lisa junto à berma
E entrego ao abismo a mente enferma
Como o escuro insciente de um armário
E eis que já não estás, eis-te partida
Do carro em que se turva o rio fundo
Onde aguardo sereno o passar do mundo
Na água onde começa e onde acaba a vida Imagem de: www.natures-desktop.com.
Stop
Deixo os automóveis passar apressados
Na sua ilusão de aquário turbulento
E sinto o sol sobre a mesa e o vento
Como se vivesse em mundos afastados
Deixo as caminonetas levar a depressão
Ao longo da rua face à esplanada
A crise que é tudo, a crise que é nada
Como se vivesse noutra dimensão
Porque tudo passa, rápido e lento
O tempo abstracto das obrigações
Saboto esse assassino de libertações
E sinto-me bem no incumprimento Imagem de: www.circulaseguro.com.
Casas
As nuvens soltas sobrevoam caladas
Os meus sonhos repetidos arquitectónicos
Que, à partida, parecem autistas, autonómicos
Mas são,na verdade, linhas partilhadas
Rodeiam-nos casas, como quem diz o amor
Tal como o conheço, pura pulsação
E ressoa na memória uma canção
Que ouvimos à noite no computador
We live in a beautiful world, e depois
Fluem imagens e sons e o futuro
E o que para outros é cimento duro
É, para nós, espaço e conforto a dois
As casas como ideias à solta no olhar
Que a noite no seu aconchego encerra
Como que abarcando todo o mar e a terra
As casas como nuvens a sobrevoar Imagem de: www.vertechinc.com (de Frank Lloyd Wright).
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