Tempo de um tempo parado, mortiço,
Todas as luzes tremem à média-luz,
Fio de aranha, o que em ti me seduz
É esse arrastar lento e movediço
De vagas ideias que em mim injectas,
Ilhas dormentes, ilhas de poetas
Vêde o ascender azul da fumaça,
Como toca os céus e neles se dilui
Como vagas vagas, constrói e rui
Cem mil pensamentos que em si enlaça
Na efemeridade, fruto proibido,
Doce e amargo, encontrado e perdido
Nota: Vivemos um tempo estranho e conturbado daquilo que o meu pai antevia outrora como a "democracia musculada", uma ideia perversa e detestável, uma realidade ainda mais perversa e detestável, já que sinónima da morte lenta de todas as liberdades sob a capa manhosa da democracia. Como em todas as ditaduras, o regime conta com inúmeros apoiantes ou, pelo menos, muito barulhentos. Ao contrário das ditaduras tradicionais, na nossa, na actual, os bufos ou chibos (usem o termo que melhor vos soar ou ambos), são supostamente os próprios cidadãos que se devem vigiar e censurar mutuamente. Não é necessária uma polícia política e que poupança isso representa para os cofres públicos! Um dos exemplos mais recentes de "democracia musculada" é a proibição de fumar em cafés, bares, restaurantes, discotecas, casinos e, inclusive, ao ar livre nas escolas (excepção aberta aos estabelecimentos de ensino superior, já que vários dos nossos ministros tecem as suas teias por esse patamar do ensino). Em breve, numa sociedade em que todos morreremos saudáveis, já nada restará de distintivo e apenas os franchises (comerciais e ideológicos) internacionais sobreviverão. O povo, facilmente influenciável pelos discursos oficiais e por figuras sinistras como a de um tal Francisco George, urra raivosa e ruidosamente contra os fumadores. E este poema, controverso como a poesia deve ser, foi escrito num dos quase impossíveis de encontrar locais onde ainda se pode fumar, talvez não por muito tempo...
Imagem de www.sxc.hu/photo/213819