sábado, maio 20, 2006

Fotografias


I



Moro numa casa forrada a gavetas,
Gavetas forradas a sensações,
Sensações forradas a fotos como tufões...
Ganham vida própria, invadem-me a roupa,
Colam-se-me à pele, tentam perfurá-la,
Como aliens de guarda, só instinto e agressão,
Cor e luz exacerbadas na total escuridão.
Ao acordar, agarro umas quantas, examino...
São folhas lisas, brancas, de um tempo aprisonado,
Gelo puro, intocado, como astros dos confins.
Que cataclismo cósmico as esvaziou assim?
Nunca Deus por lá passou, nem deuses,
Anjos, demónios, entes espirituais...
Papel couché todo em branco, milagre da concepção.



II



Devo ter uns sete, oito anos...
É Páscoa e os peixes sofrem a rapina.
- Diz-me, filho, em que pecaste?
- Acho que respondi mal à minha avó...
- Reza três Pais Nossos e dois Avé Marias.
Tenho, agora, a alma absolutamente branca
E incontáveis fotos, brancas também, para a eternidade.

1 Comments:

Blogger filomena said...

gostei do poema.

Boa semana

11:06 da tarde  

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