Pobre Job
I
Pobre Job, encurralado entre duas fogueiras!
Conta-se que a fé lhe devolveu tudo a dobrar,
Inclusive os tempos de miséria e decadência
Para sempre multiplicados na recordação...
Que justiça inenarrável lhe não quis apagar a memória?
Pobre árvore de fruto, imóvel e prisoneira da terra ressequida,
Que amargor do seu pingo de fel não-revoltoso,
Paraplégica de nascença, quem a compensou?
Pobre Ahmed, Mahmoud, Selim, trigésimo filho de uma parideira!
Vivendo da caridade nas ruas confusas de odores entrelaçados,
Dormindo à porta da rua, subindo a casa, pela manhã, para servir...
Quem lhe devolverá a alma para que possa entrar no paraíso?
II
Vejo-os pilhar, matar, violentar tudo à passagem,
Improvisar câmaras de gás, monóxido de carbono das chamas da fé,
Banqueteiam-se com leitõezinhos humanos infiéis,
A carne assada cheira-lhes a paraíso...
Cinco mil mortos, todos os dias cinco mil...
Um homem gargalha, santificado no sofrimento alheio,
Exige cinco mil mais, cinco milhões, quantos couberem
Entre as piras justiceiras dos autos de fé
E as nuvens de fumo ascendem, criativas, em direcção aos céus...
É justamente o paraíso o seu destino -
Aí usufruirá de cinco mil virgens, cinco milhões, quantas couberem...
Quem lhes pediu a sua opinião?
Imagens de www.grenblade.com e www.whatreallyhappened.com.
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