Ode aos anarquistas do Primeiro de Maio
Este poema foi inspirado por notícias veiculadas na televisão de que a polícia se encontrava de prevenção no Primeiro de Maio, visto serem aguardadas manifestações violentas por parte de "esquerdistas" portugueses e estrangeiros. Que pedrada no charco, nesta terra adormecida por tão brandos costumes! Claro que nem eu tenho idade nem disposição para participar em motins, nem me responsabilizo por qualquer manifestação "não-autorizada" que eventualmente possa partir de grupos esquerdistas que, como alguém disse, "se dedicam a destruir o que custou aos outros a ganhar". Como, aliás, permitam-me salientar, de forma alguma me responsabilizo pela destruição insidiosa que as nossas classes dirigentes têm vindo a semear...
Nota a 2 de Maio, apenas para os anais da história: como já deveria ter calculado, os anarquistas portugueses, convenientemente vigiados pela PSP, levaram a cabo uma marcha silenciosa. O facto praticamente não foi noticiado pelos canais de televisão.
I
Circulo no meu automóvel, tão pequeno e arrombado
Com a gaveta toda aberta, pára-choques amolgado
Ruídos na direcção e um risco na porta do lado
Travo numa rotunda face a um Mercedes potente
Que surge da ruazinha e se intromete na frente
Conduzido por uma dama que leva a prole contente
Tenho que ficar calado, melhor ficar indiferente
E então exclamo para dentro, calando a história e a alma
Quantas vidas desgraçaste?
Quantos divórcios causaste?
Quanta gente despediste?
Quantos salários diminuiste?
Quantos momentos roubaste?
Quantos orgasmos fingiste?
E ela leva o carro e a prole como quem leva o seu cão
E eu chego ao primeiro de Maio, filho da revolução
II
Ei-los...
Os sindicalistas barricados em razoabilidade
Os palanques bem montados numa praça da cidade
Chega sua excelência, saúda sua eminência
Encontram-se todos ali, num dia feito de ausência
Curvam-se, bem comportados, numa breve reverência
O país goza o feriado, o país todo adormece
E ali perto, num beco, um cão vadio apodrece
Subitamente...
Um ruído
Um clarão
Uma massa
Um maremoto
Cocktails molotov pelos ares
Montras de bancos em estilhaços
O mármore todo em pedaços
Parelepípedos lançados contra a polícia de choque
Senhoras e senhores entrechocam-se atarantados
BMWs e Mercedes balouçam de pernas para o ar
Os palanques caem todos como baralhos de cartas
A cidade a ferro e fogo, as câmaras a filmar
A vingança que se atiça e no beco o cão a uivar
III
Bum! Bum! Bum!
(Um desastre de proporções bíblicas
Uma calamidade pós-diluviana
Deuses pré-colombianos engolindo corações)
Viva Pancho Villa!
Imagem de: http://media.portland.indymedia.org.
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