quarta-feira, abril 25, 2012

Ninguém sabe

25 de Abril de 2012, chove, os velhinhos recusam-se a participar, fazem-se longuíssimos discursos na Assembleia das Vaidades e ninguém ouve porque ninguém tem capacidade real para escutar lengalengas. Temos, portanto, um hemiciclo cheio com alguém que fala e um público que escuta monossílabos ocasionais e um televisor que nos convida a escutar monossílabos ocasionais. Só que ninguém sabe... Ninguém sabe de nada. As populações afastadas da politiquice também não sabem de nada. Sabem que o dia a dia é constituído por barreiras que o termo banalizado "kafkiano" é demasiadamente suave para descrever e que impedem o avanço em todas as direções num labirinto de espelhos e que as palavras são levadas pelo vento, como alguém dizia. "A nossa jovem democracia...", dizia um dos peixinhos gordos daquele aquário e eu tinha mesmo acabado de dizer que eram quase 48 anos. Os portugueses, que tanto gostam de citar, e que talvez não sejam eles, não sabem senão que vivem num daqueles pesadelos infantis em que se é perseguido mas não se consegue correr, sabem aliás cada vez menos, e os velhinhos nem sabem nem querem saber dos portugueses; porque haveriam, aliás, de querer saber de algo se são tão mais importantes os seus quinze minutos de fama desmultiplicados numa plena sonolência nacional? Há quem se ria em Paris. Suponho que também os peixinhos e os velhinhos se riam na sua degenerescência geral. E pouco me importa porque me importa mas não pode nem deve importar. São as exportações que crescem e pergunto-me como - talvez haja muitos conhecimentos no seio do nosso pesadelo burocrático. Ou então, como sempre, nunca se sabe. E como ninguém sabe, partilho hoje convosco, mais do que um chatíssimo Canto Livre, os Queen of the Stone Age e o seu No One Knows. Porque ninguém sabe, sim. E, fundamentalmente, à boa maneira portuguesa, porque gosto e me apetece...


domingo, abril 15, 2012

Canção da luz (a David Bowie inclusive)


A luz varrendo as fachadas limpas
Do Porto que pensei conhecer;
Num sonho como num sonho
Tremi de alegria e tristeza
Como a luz na sua força frágil
Ao entender o tempo subjetivo
Embrulhado na mente subjetiva...

Esqueci tudo o que me disseram
E sobretudo o que alguma vez pensei
Tenho sete anos para pensar de novo
E sete segundos para ser esquecido...

sábado, abril 14, 2012

Totalmente em direto


Eis o entrevistador que fala de cancro e a entrevistada que fala de cura sorri e ajeita o cabelo o entrevistador afirma categoricamente quem fez uma laringectomia não é um inválido claro concorda a entrevistada deve adaptar-se apenas pequenas adaptações e aposto que o entrevistador seleciona todos os amigos desse modo todos sofreram laringectomias e falam através de aparelhos na garganta com vozes de robô somos aliás todos mais bondosos que os mitos e o próprio jesus o tal que se diz que castiga quando parece a alguém que algo sai da norma mas parece que a laringectomia não sai da norma tal como os monopólios energéticos os impostos excecionais sobre a restauração e os cortes como no salão de cabeleireiro de um chapeleiro louco aplicando éter muito éter à clientela e o mundo inteiro cortado sob anestesia aliás todos os estudos internacionais dignos desse nome apontam para o facto de que tanto faz uma turma ter vinte como trinta alunos a qualidade nunca é afetada economicismo mas qual não se trata disso mas apenas de éter de éter e de anestesia e já agora qual foi a última vez em que alguém te deu uma informação correta e que não te sugou o delicioso tutano

quinta-feira, abril 05, 2012

Sintra armadilhada


A Sintra central está armadilhada
Com souvenirs caros e ímanes de Lisboa
Elétricos vários, Amália, Pessoa
E galos de Barcelos que não cantam nada

Não muito distante, como inexistente
Dormitam Queluz e o palácio imperial
Paredes rasgadas do restauro a mal
Jardins e chaimites num rosa indolente

E é interessante ver o abandono
Nas lojas de Sintra, plenas de vida
Da nossa Versalhes meio esquecida -
Lisboa, Lisboa, Lisboa no trono!

Noturno vazio de Sintra


Em Sintra, com esse à maneira atual
Ainda nem onze da noite bateram
E quase parece que todos morreram
Exceto alguns cães de tamanho abismal

Percorremos ruas escuras, vazias
E tudo encerrou: cafés, restaurantes
Lojas que exclamam descontos errantes
E casas fechadas, persianas frias

E ao deambularmos nas ruas caladas
O Eça estranha-se na imaginação
E entranha-se antes uma negação
Só contradita nas nossas mãos dadas

Nas ruas sombrias da Sintra estrangeira
Se passa por vezes um carro isolado
Ou se ouve uma voz num tom mais elevado
Parece irreal, quase brincadeira

E se tudo isso é profundo ou banal
Pouco nos importa, é só uma imagem;
É preciso às vezes partir em viagem
Para nos encontrarmos num outro local
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